As eleições de 2020 estão sendo atípicas por causa da atual pandemia, e Marcelo Mascarenha, procurador do município de Teresina, advogado tributarista e mestrando em Estado, Governo e Políticas Públicas, destaca que o distanciamento torna a escolha do candidato mais difícil.

 

 

Todas as eleições municipais, estaduais e federais trazem reflexos negativos ou positivos para a classe trabalhadora. Como o eleitor pode identificar qual candidato possui as melhores propostas?

Gosto de dizer sempre que a prática é o critério da verdade. Por isso, a primeira coisa é confrontar o que o candidato diz no período eleitoral com sua atuação nos outros períodos. Às vezes, por força da marquetização da política, em que a forma vale mais que o conteúdo, muitos candidatos fazem as mesmas promessas, repetem discursos parecidos. Então é pela prática política deles que podemos distinguir. Se é alguém que já exerce ou exerceu mandato, como se comportou? Dialogou com a população? Defendeu os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras? É a favor da reforma agrária? Defendeu o serviço público de qualidade? Ou só faz a defesa dos ricos, dos grandes fazendeiros, dos bancos? Tem muito candidato que no discurso diz uma coisa, na sua ação cotidiana faz outra. Há muita demagogia. Há certos discursos falsos que escondem o que realmente importa. Candidatos que tem pose de super herói, que fazem discursos violentos contra a corrupção, mas que são contra os investimentos sociais em saúde e educação, defendem a retirada de direitos trabalhistas, apoiam a venda do patrimônio do povo brasileiro através de privatizações, são contra a defesa dos direitos da parcela oprimida da população (mulheres, negros, indígenas, pessoas com deficiência). É preciso estar atento e derrotar com o voto esse tipo de candidato.

 

A campanha deste ano, sem dúvida, será a mais atípica dos últimos tempos. Fórmulas e manuais estão sendo reinventados em função de restrições inéditas e devido ao cenário imposto pela pandemia, que deflagrou crises sanitária, econômica e social, simultâneas. Como esse cenário pode influenciar na hora de escolher o candidato?

Infelizmente a pandemia tornou mais difícil o contato pessoal com os candidatos e candidatas. É mais complicado a realização das reuniões presenciais, que são momentos em que se o eleitor fica frente a frente com quem se candidata para fazer cobranças, esclarecer dúvidas. É também uma oportunidade para os que querem se eleger conheçam as comunidades e suas carências. A falta desses momentos torna a escolha mais difícil, pelo que é muito importante que o eleitor acompanhe os programas eleitorais e as propostas dos candidatos nas plataformas digitais. Conhecer é fundamental para fazer uma boa escolha.

 

Com a pandemia, as redes sociais se tornaram uma grande plataforma para os candidatos e com isso surgem também as fake news. Como o eleitor pode analisar as propostas de candidatos sem cair nas fake news?

Esse é um desafio bem atual. As fake news tiveram uma grande influência nas eleições de 2018, e hoje nosso país paga um preço muito alto por isso, com um governo que tem destruído direitos, sucateado os serviços públicos e subordinado o Brasil aos interesses de outras nações. Minha principal orientação é: nunca repasse uma notícia, até ter certeza que é verdadeira. As notícias falsas são espalhadas porque muitas vezes são recebidas em grupos de whatsapp, vindos de pessoas de confiança. Você parte do pressuposto de que são verdadeiras e repassa sem investigar. Deve-se evitar isso. Há meios de se verificar se uma matéria é verdadeira ou falsa. Quase sempre uma simples pesquisa em uma página de busca já dá a resposta. Há várias páginas especializadas em desmontar fake news e hoje vários veículos de comunicação tem seus próprios instrumentos de verificação.

 

Algumas pessoas não se identificam com as propostas dos candidatos apresentados e preferem não comparecer às eleições ou votar nulo ou branco. Quais as consequências dessa ação? Qual a importância do voto?

O voto universal foi uma conquista da classe trabalhadora. Houve época em que só podiam votar as pessoas que tinham determinada quantidade renda ou propriedade: era o chamado voto censitário. Por muito tempo, mulheres e analfabetos foram impedidos de votar. E houve tempos de ditadura, em que as eleições ou não aconteciam, ou não se davam de forma livre. Pessoas foram presas, exiladas, torturadas e até mortas para que o direito ao voto fosse respeitado. Então é muito importante valorizar o voto: ele custou a vida e o sangue de muita gente. Desde a redemocratização do Brasil, após a Constituição de 1988, o exercício do voto pela maior parte da população possibilitou o avanço em importantes políticas públicas que melhoraram a vida das pessoas. O ruim de não gostar de política é que você acaba sendo governado por quem gosta. Você se abstém de participar, vem outro e escolhe por você. Quando se diz que todo político é corrupto, desonesto, que gente séria não se mete em política, o que estão na verdade é tentando desestimular você a participar. Só os maus políticos ganham com isso. Não vote branco, nem nulo, nem se abstenha. Participe. E se nenhum candidato parece digno de seu voto, dê um passo adiante: se candidate você. Pode ser que o político diferente que você esteja esperando seja você mesmo. Mas não lave as mãos e não deixe que os outros decidam por você. Assim também deve ser enfrentada a compra e venda de voto. Quem oferece vantagem pessoal em troca do voto já deixa patente que não está comprometido com o exercício de um mandato decente. Quem vende o voto perde o direito de cobrar aquele que elegeu, porque o negócio se encerrou com a entrega do dinheiro e o exercício do voto. Como diz o jargão já batido: voto não tem preço, tem consequência.

 

 

Após as eleições como o trabalhador pode acompanhar e cobrar as ações prometidas pelo candidato?

Esse é o grande desafio da democracia representativa. Apesar da importância do voto, o ato de votar não esgota toda a dimensão da participação política. Nos intervalos entre as eleições, deve-se acompanhar a atuação do político que foi eleito. Ver se as promessas estão sendo cumpridas, seus posicionamentos, suas contradições. Inclusive para colocar isso na mesa quando ele novamente aparecer pedindo o voto em uma eventual nova candidatura. Mas para além desse acompanhamento pessoal, é muito necessário o acompanhamento coletivo, através da organização nos sindicatos, nas associações, nos movimentos. A força política da classe trabalhadora é muito maior e mais relevante quando não agimos só como indivíduos, mas como sujeito coletivo. Organize-se. Filie-se ao sindicato. Vote e lute.

 

 



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